Novos
prefeitos enfrentam condições precárias no início da gestão
Imagine chegar ao trabalho e dar de cara com um buraco de
12 metros no seu escritório. Ou então você não pode acender a luz, porque a
conta não foi paga. E nem ir ao banheiro, porque falta o vaso... Essa é a
realidade de muitas prefeituras pelo brasil.
“Quando nós assumimos, em 2009, tivemos o compromisso
maior de sanear o município, de preparar o município para frente”. A frase foi
dita por Bevilácquia Matias em discurso quando era prefeito da cidade de
Juazeirinho, no interior da Paraíba. “Hoje nós temos todas as finanças do
município saneadas”.
Mas a sucessora dele, que foi eleita no ano passado, diz
que encontrou a prefeitura com a energia elétrica cortada por falta de
pagamento. “Nós assumimos a prefeitura do município literalmente às escuras”,
diz a prefeita Carleusa Marques.
Ano nova vida nova. Hora de botar os planos em ação. Mas
os novos prefeitos de 12 cidades visitadas pelo Fantástico essa semana estão
tendo péssimas surpresas.
Quando assumiram, os novos prefeitos de Holambra,
Tufilândia, Ipojuca, Alcobaça, Alhandra e Porto Acre também deram por falta de
computadores. Dizem que os discos rígidos sumiram ou foram zerados.
“Estamos trabalhando no escuro, completamente no escuro.
Pedimos informações a alguns funcionários. Ninguém sabe ninguém viu”, conta
Mariluce Almeida, secretária de Finanças de Alhandra (PB).
Assim fica difícil saber em que pé está à cidade. Os
ex-prefeitos desses municípios afirmam ter deixado tudo direitinho pra gestão
seguinte.
“A única coisa que foi tirada de lá foram os processos de
pagamentos e entregue ao tribunal de contas”, afirma Leo Brito, ex-prefeito de
Alcobaça (BA).
E a ex-prefeita de Holambra, no interior de São Paulo,
diz que o computador era dela e que, mesmo assim, não tinha informações
importantes. “O computador da prefeita, que informação que tem?”, diz Margareth
Groth.
A sede da prefeitura de Holambra também não tem móveis. A
ex-prefeita diz que levou embora porque também eram dela. “Quantos prefeitos
num compra os móveis do próprio gabinete dele? Isso é normal”, aponta
Margareth.
Um vídeo gravado em São Mateus mostra um grupo de homens
levando embora o que seria o aparelho de raios-X do hospital local, que não
estava em boas condições. O ex-prefeito da cidade afirma que deixou dinheiro em
caixa e que a máquina de raios-X foi levada mesmo.
“A máquina de raios-X do hospital do município era
alocada de uma firma sediada em São Luís. O dono, no término do mandato, mandou
buscar, porque expirou o contrato”, explica o ex-prefeito Francisco Rovélio.
Nessas condições, quem paga a conta - e sofre - é a população.
No hospital de Juazeirinho, o lençol é da família da paciente! “É assim mesmo a
gente chegava aqui, não tinha lençol”, diz Claudenice Santos Silva, mãe de
paciente. O lençol que a filha usada foi levada pela tia.
O Fantástico encontrou carros quebrados, sem condição de
rodar, em várias cidades. Nenhuma ambulância funciona em Juazeirinho. “Não tem
o motor, né? O motor dela não se encontra”, diz José Oliveira, chefe de
transporte do município paraibano esse motor
é que está doente! Foi encontrado, segundo a prefeitura, dentro da ambulância.
Em nota, o ex-prefeito de Juazeirinho Bevilácqua Matias afirma que, na gestão
dele, foram adquiridos veículos novos. Ele diz também que toda a documentação
da cidade está no município, assim como os computadores e que Juazeirinho
tinha, para a área de saúde, mais de R$ 300 mil em conta quando ele deixou o
cargo.
Pedro Serafim, ex-prefeito de Ipojuca, no Piauí, afirma
que tanto os veículos da cidade quantos os computadores funcionam. Segundo o
ex-prefeito, imagens feitas pela equipe dele comprovam isso.
João Teles, ex-prefeito de Bujari, no Acre, afirma que
deixou a cidade em condições de ser administrada por qualquer prefeito. Mas a
atual administração diz que está passando necessidades. Também por falta de
pagamento, prédios das administrações de Miguel Alves entraram em 2013 sem
energia. “O computador que continua as informações de transferências de aluno
desapareceu”, diz José Pereira, secretário de Educação e Miguel Alves (PI).
“Nesse momento, estamos sem dado algum, fazendo um
trabalho de detetives aqui para ver o que podemos descobrir”, afirma Pedro da
Silva, prefeito de São Domingos (SE).
Onde falta informação tem muita coisa importante que
também faz falta.
“Até o momento, a gente não tem dinheiro para comprar
água dentro da prefeitura, porque a gente não teve acesso a nenhuma conta
ainda. Não pude fazer senha, nada”, revela Carleusa.
“Viver é ruim sem água”, diz Adílson Henrique da Silva,
de 13 anos. Ele é sensível, um amigo dos livros, mas não tem tempo para ler
como queria. Na beira de uma estrada movimentada, Adílson transporta vizinho e
amigos em uma charrete e busca água para as necessidades básicas da família. “Desde
janeiro do ano passado não tem chuva aqui em Juazeirinho para arrumar água nem
nada”, diz o biscateiro José Adenildo, que sai com um tambor para tentar
conseguir água.
A cidade depende de caminhões-pipa porque o açude secou.
Enquanto o caminhão não chega, os trabalhadores rurais tentam salvar os animais
com água enlameada. “É muito ruim assim. Só se bebe porque é o jeito mesmo.
Está muito ruim, salgada”, diz um criador. A água, conta, só serve para os
animais: “Só para bicho. Para humano não presta”.
Para enfrentar os problemas da cidade, Juazeirinho
precisa de dinheiro, claro.
Fantástico: Quanto a senhora encontrou no caixa da
prefeitura?
Prefeita de Juazeirinho: No caixa da prefeitura, R$ 2,10.
“Encontramos uma prefeitura no escuro e totalmente
sucateada, faltando computadores. Levaram as CPUs”, diz a prefeita.
“Não existem arquivos, que é a principal prova de
documentação de uma administração”, revela Pedro Alves da Nóbrega, promotor de
Justiça da Paraíba
José Robson Mecenas, ex-prefeito de São Domingos,
Sergipe, não quis gravar entrevista. Ainda em São Domingos, quando os
funcionários chegaram para o primeiro dia de trabalho, encontraram um buraco de
12 metros de profundidade dentro da prefeitura. No fundo do buraco, restos do
que parece ser uma papelada. Até hoje, o novo prefeito não sabe para que serve
o buraco.
Já em Canavieiras, a surpresa veio de cima. A prefeitura
diz que mandou instalar uma antena de TV. Aí o técnico teve uma surpresa:
“Quando eu fui ver o sistema de calhas, de calhamento, para seguir o fio de
áudio e vídeo, foram encontradas uma microcâmera e uma pré-escuta direcionado
para a mesa do prefeito”. O caso foi parar na polícia. O ex-prefeito Zairo
Loureiro nega envolvimento.
Até agora, pelo menos três das 12 cidades citadas nesta
reportagem pediram ajuda à polícia. Em Juazeirinho, o Ministério Público também
investiga a situação da prefeitura.
“Não vemos a saúde, não vemos a segurança, a educação;
não vemos funcionar da maneira que é pra funcionar. O município de Juazerinho
está entre aqueles que hoje estão sofrendo com esse problema da seca, e não há
a assistência necessária pra suprir essa falta. Não é suprido. Por quê? Por
causa de desmandos com dinheiro público”, afirma o promotor Pedro Alves da
Nóbrega.
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